Saúde mental nas escolas médicas: trabalhando com percepções de acadêmicos de Medicina

Cely Carolyne Pontes Morcerf, Pedro Hernán Cabello Acero

Resumo


A figura do louco, moldada como personagem causador de desordem, associada a temor e periculosidade levou à exclusão do convívio social, com expulsão de cidades e institucionalização de pessoas diagnosticadas com transtornos da mente durante a Idade Média. No século XVIII, o hospital entra como símbolo terapêutico e o médico se torna o responsável pela liberdade, tratamento e isolamento desses indivíduos. A rejeição do convívio social desses pacientes enraíza estigmas e preconceitos que são mantidos no meio médico atual e que necessitam de desconstrução na formação do estudante de medicina. O presente trabalho buscar abrir debates e reflexões de percepções de acadêmicos sobre contato e abordagem de pacientes com transtornos mentais, ensino da saúde mental, trabalho da psiquiatria, terapias integrativas e possíveis impactos na prática clínica, direcionados para melhorias na formação do ensino em saúde. Trata-se de um estudo quali-quantitativo, de abordagem empírica, associado à revisão de literatura, com seleção de 39 artigos, que focam no ensino de saúde mental. Aplicação de questionário em 133 estudantes de medicina de uma universidade privada do Rio de Janeiro, que cursavam o primeiro, sexto período do curso e internato médico. As inferências foram feitas com auxílio do Software SPSS V.16. É destacado o sentimento de medo do estudante de medicina em relação ao primeiro contato com um paciente psiquiátrico, principalmente no início do curso (p=0,000), a necessidade de ampliação do contato do estudante de medicina com a saúde mental (p=0,04), o sentimento de despreparo para atender um portador de transtorno mental, falhas no referenciamento de pacientes para acompanhamento da psiquiatria, manutenção de visão hospitalocêntrica da assistência de saúde mental, carência de conhecimento e contato com terapias integrativas. É essencial que as faculdades de medicina ampliem a carga horária de ensino e contato da saúde mental, em seus diversos campos de atuação no SUS, garantam o suporte e a humanização da assistência, para a formação do médico generalista, e amparo dos estudantes quando os mesmos adoecem.


Palavras-chave


Saude Mental; Psiquiatria; Educação Médica

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